As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do Irecê Notícias. Os conteúdos apresentados na seção de Opinião são pessoais e podem abordar uma variedade de pontos de vista.
Todo ano, ao chegar setembro, uma onda de mensagens de esperança invade nossas redes sociais. O famoso “Setembro Amarelo” surge como uma campanha de conscientização sobre o suicídio, envolvendo celebridades, influenciadores e uma série de eventos com balões amarelos, frases de efeito e números de ajuda. Contudo, em um país onde o suicídio entre adolescentes cresce mais rápido que em qualquer outra faixa etária, segundo a Fiocruz, fica a pergunta: isso tudo é realmente eficaz? Ou estamos apenas pintando o cenário de uma tragédia com cores mais bonitas, sem enfrentar a real gravidade do problema?
A verdade é que, ao analisarmos os dados friamente, a situação é alarmante. De acordo com a Fiocruz, o suicídio entre adolescentes no Brasil aumentou 6% na última década, em um ritmo acelerado que revela uma epidemia silenciosa. Enquanto falamos sobre o problema, muitos jovens continuam sofrendo calados, enfrentando uma tempestade de pressões sociais, acadêmicas e, mais recentemente, até o impacto de apostas on-line. Sim, estamos falando de adolescentes caindo nas garras de joguinhos virtuais, onde, entre uma partida e outra, a promessa de dinheiro fácil se transforma em dívidas e, eventualmente, no vazio existencial. Mas o que fazem as campanhas amarelas diante disso? Prometem ouvidos, mas a realidade é mais amarga: não há estrutura para ouvir.
Um caso marcante é o do jovem bolsista do Colégio Bandeirantes, em São Paulo, que após uma série de investidas dos colegas que praticavam bullying e homofobia com o estudante, cometeu suicídio. Um adolescente brilhante, com notas exemplares e futuro promissor, mas que não resistiu às pressões invisíveis que se acumulavam dentro de si. O episódio causou comoção nacional, levantando um debate sobre o papel da escola, da família e da sociedade na formação emocional dos jovens. O suicídio entre jovens não é apenas um reflexo de problemas internos; é também um grito abafado contra um mundo cada vez mais desigual, acelerado e desumanizador.
O sociólogo Émile Durkheim já afirmava que o suicídio está intimamente ligado à estrutura social. Para ele, quanto mais a sociedade impõe exigências de sucesso, realização e perfeição, mais frágil se torna a psique de quem não se encaixa nessas normas. Hoje, a situação só piora. Em um mundo onde adolescentes são bombardeados por imagens de sucesso nas redes sociais e influenciadores vendem uma vida de sonho inalcançável, é natural que muitos jovens, ao não conseguirem atingir esses padrões, sintam-se derrotados. E isso, meus caros, não é algo que uma campanha com balões coloridos vai resolver.
Então o que o "Setembro Amarelo" faz diante dessa nova realidade? É que, muitas vezes, as pessoas interpretam ele como se o problema fosse apenas uma questão de falta de comunicação, de alguém não ter um ombro amigo para desabafar. Claro, a ideia de quebrar o tabu sobre o suicídio é importante. Mas campanhas que simplesmente pedem para "falar" e "procurar ajuda" parecem, muitas vezes, insuficientes. É como se estivéssemos oferecendo band-aids a alguém que está gravemente ferido. O problema é mais profundo, sistêmico, e envolve a falência de nossas instituições educacionais, sociais e econômicas.
O que o senso comum também não compreende é que, em muitos casos, o suicídio não é um "ato de fraqueza" ou um "chamado por atenção". É uma consequência trágica de um sistema que falha em dar suporte emocional, que valoriza o sucesso financeiro acima de tudo, e que ignora as doenças mentais até que seja tarde demais. E nesse contexto, a juventude se encontra desprotegida, sem estrutura psicológica e sem redes de apoio adequadas. Nem mesmo as escolas, que deveriam ser um espaço de desenvolvimento integral, estão preparadas para lidar com essas questões.
Em resumo, o Setembro Amarelo, apesar de suas intenções nobres, talvez precise de uma narrativa mais crua e realista para realmente tocar o cerne da questão. O problema do suicídio entre jovens é multifacetado e intrincado, exigindo mais do que mensagens positivas superficiais. Necessitamos de uma abordagem que destile as sutilezas da dor humana, que reconheça a urgência e que, acima de tudo, proponha intervenções que sejam impactantes e retirem dos ombros de todos a pressão esmagadora por sucesso financeiro, lógica produtivista e que analise a falta de oportunidades, e a ausência de um suporte emocional eficaz – sem isso –, continuaremos a ver a juventude se desintegrar.
*Chal Emedrón, pseudônimo de Carlos Medeiros, licenciado em Letras pela Universidade Federal da Bahia, apaixonado por cultura pop e comportamento humano.